Atualmente, vivemos momentos difíceis no campo jurídico. Desde o início dos escândalos – Mensalão, Lava Jato – e das diversas operações da Polícia Federal, houve a decretação de prisões temporárias como forma de coação e prisões preventivas como punições antecipadas. Porém, isso contraria tudo o que os nossos doutrinadores e nossos tribunais diziam a respeito do assunto.
A prisão, independentemente de sua natureza, somente pode ser decretada em casos excepcionais. Na primeira hipótese, a regra era e deve ser a intimação para depor e não a imediata decretação da prisão temporária em desfavor do averiguado, acabando por ser a oitiva colhida sob pressão e com a condição de que “se não colaborar” poderá continuar presa e ter a prisão inicial convertida em prisão preventiva.
Esta mesma tônica – da excepcionalidade – deveria cercar a ordem judicial preventiva. Ela somente cabe em situações em que haja prova irrefutável e veemente de autoria e materialidade – pressupostos – e quando presente alguma ameaça concreta à ordem econômica e pública ou à instrução criminal e aplicação da lei penal – requisitos.
Dentro deste panorama de novo entendimento e aplicação das normas, evidentemente mais rígido, as inovações surgidas que deveriam afastar e diminuir o rigorismo das prisões, impondo medidas alternativas, são utilizadas de maneira extremamente tímida pelo Poder Judiciário. Efetivamente, com as diversas medidas de controle e fiscalização eletrônica possíveis, em muitos casos em que se impôs medida prisional, certamente poderiam ter sido aplicadas medidas difusas. É perfeitamente possível – mediante sistema de localização digital, por exemplo -, saber se o acusado-investigado está em sua residência, está trabalhando ou por onde anda. Assim, a colocação de tornozeleira ou pulseira eletrônica, a proibição de deixar a residência ou de não se comunicar com certas pessoas pode ser fiscalizada, mesmo que à distância.
Por isso, se decretar uma prisão, sob o escopo de suposições ou deduções de que aquele réu poderia fazer isso ou aquilo, não nos parece de acordo com a ordem constitucional-processual vigente, mesmo que a contragosto dos acusadores que, diferentemente, sempre preferem a imposição de medida carcerária.
Os defensores da prisão imediata esquecem da calamidade e da situação penitenciária no Brasil. E olvidam do enorme constrangimento gerado com essas medidas. Essa coação indevida e arbitrária, muitas vezes, é irreparável, ainda que o acusado venha a ser solto e absolvido.
A marca na dignidade e no seio da família é indelével e jamais desaparecerá. Com tristeza, temos que constatar e dizer que a mentalidade de uma parte dos juízes ainda remonta a entender que a prisão é como se fosse uma obrigação, quando, na verdade, deveria ser a última alternativa.
Sendo a exceção, a restrição do direito de liberdade deveria ser avaliada de forma mais garantista, permitindo-se que o acusado – enquanto mero acusado e presumivelmente inocente – possa responder solto ou mediante o cumprimento de certas obrigações – artigo 319 do Código de Processo Penal – ao andamento e instrução do processo.
Nenhuma prisão pode ser decretada por causa de situações geradas por clamor público ou por causa do clima existente no país. Esta somente é cabível em situações concretas, amparadas na necessidade e devidamente motivadas. Esperemos que a Suprema Corte, enquanto guardiã da Constituição, retome entendimentos anteriores, justamente para que não soframos com essa onda policialesca e essa mentalidade a favor de prisão a todo custo.
Daniel Leon Bialski
Daniel Leon Bialski, Mestre em Processo Penal pela Pontifícia Universidade Católica de São Paulo (2008). Bacharel em Direito pela Pontifícia Universidade Católica de São Paulo (1992). Membro do Instituto Brasileiro de Ciências Criminais – IBCCRIM e da Comunidade de Juristas de Língua Portuguesa (CJLP). Foi Vice-Presidente da Comissão de Prerrogativas da Seccional Paulista da OAB entre os anos 2008/2009.
Ingressou na banca fundada por seu pai e mentor, o saudoso Dr. Helio Bialski, ainda no ano de 1988, então denominada “Helio Bialski – Advogados Associados”, onde estagiou. Ao graduar-se em 1992, passou a figurar como Sócio do escritório, o qual passou a denominar-se “BIALSKI ADVOGADOS ASSOCIADOS“. Atua nas diversas áreas do Direito Penal, possuindo destacada atuação perante os Tribunais do país. Outrossim, milita na esfera do Direito Administrativo Sancionador, notadamente processos administrativos disciplinares nos órgãos censores de classe (em especial na Corregedoria da Polícia Civil).
Atualmente, Daniel Leon Bialski é Presidente da Sinagoga Beth-el em São Paulo; atua como Secretário-Geral do Clube A Hebraica de São Paulo; atua como tesoureiro da Sinagoga Beith Chabad Central; é Diretor do Museu Judaico de São Paulo; é membro do Conselho de Ética e Conselheiro do Sport Club Corinthians Paulista.
PUBLICAÇÕES:
– BIALSKI, Daniel Leon. In Extradição e Prisão Preventiva; 2008; Dissertação (mestrado em Direito Processual Penal) – Pontifícia Universidade Católica de São Paulo, Orientador: Marco Antonio Marques da Silva.
– BIALSKI, Daniel Leon. A dignidade da pessoa humana como forma de garantia à liberdade na extradição. In Tratado Luso-Brasileiro da Dignidade Humana. SILVA, Marco Antonio Marques da (Org.). 1ª edição. São Paulo: Quartier Latin, 2008.
– BIALSKI, Daniel Leon. Da nova interpretação do artigo 567 do Código de Processo Penal Brasileiro após a Constituição Federal de 1988. In Processo Penal e Garantias Constitucionais. SILVA, Marco Antonio Marques da (Org.). 1ª edição. São Paulo: Quartier Latin, 2008.