No semestre passado, no curso de Direito e Tecnologia, discutimos o uso de sistemas de dados (inteligência artificial) para melhorar as decisões sobre encarceramento nos EUA[1]. Resultados preliminares estimam que o sistema de dados manteria 45% menos pessoas seriam mantidas presas, sem qualquer prejuízo para a sociedade em termos de reincidência. O foco da discussão na sala girou em torno do fato que o sistema teria um viés racial, mantendo presas proporcionalmente mais pessoas negras. Dilema fácil? Usar ou não usar? Ainda parece algo distante?
No Brasil da Lava Jato, talvez outra história seja mais próxima da realidade. A Rolls Royce foi processada pelo Serious Fraud Office britânico por corrupção no Reino Unido e no Brasil[2]. Como resultado da investigação, a empresa pagou £ 500 milhões (o equivalente a R$ 2 bilhões), incluindo £ 13 milhões à agência governamental pelo custo da investigação (os ingleses e suas inovações…)[3]. Menos comentado é fato que o uso de sistemas de dados foi crucial para evitar a prescrição de vários crimes. Um robô caça -crime desenvolvido pela startup RAVN examinou pilhas de documentos para encontrar evidências e foi peça fundamental na conclusão do processo[4].
Para tornar a coisa mais próxima ainda, que tal dar nomes aos bois, no caso aos melhores advogados criminalistas privados em termos de habeas corpus concedidos pelo Supremo Tribunal Federal (STF)? Afinal, esse é um campo no qual tradicionalmente não se contrata com base em dados, e sim no prestígio.
Nossa provocação passa pela constatação de que não apenas a cultura de dados entre nós é pequena, mas também que o próprio acesso aos dados é muito difícil. É bem capaz que esses dois fatores estejam relacionados. A falta de cultura de dados não demanda verdadeira transparência no seu trato institucional.
Esse ciclo vicioso impede que o Direito passe uma necessária revolução orientada por dados. Lançado o desafio, resolvemos investigar os habeas corpus concedidos pelo STF de 2009 a 2017. Constatamos que, no total, 2.914 advogados apresentaram pedidos no STF, em favor de 51.627 pacientes diferentes.
Entre os casos vitoriosos, 1.818 foram patrocinados por advogados públicos, basicamente a Defensoria Pública. As outras 2.172 ações com desfecho positivo foram patrocinadas por advogados privados. O ranking de advogados privados que mais venceram habeas corpus nos últimos anos é o seguinte:
Alberto Zacharias Toron 20
Rodrigo Corrêa Godoy 16
Victor Hugo Anuvale Rodrigues 14
Walter Barbosa Bittar 12
Luiz Carlos da Silva Neto 12
Daisy Cristine Neitzke Heuer 9
João Carlos Pereira Filho 9
Vladimir de Amorim Silveira 9
Antonio Nabor Areias Bulhoes 8
Rodrigo Trindade 8
Leandro Lourenço de Camargo 8
Tiago Leardini Bellucci 8
Guilherme Gibertoni Anselmo 7
César Augusto Moreira 7
Ahmad Lakis Neto 7
Luiz Fernando M. Gomes De Oliveira 7
Kátia Maria Lobo Nunes 6
Paulo Sergio Severiano 6
José Luis Stephani 6
Marco Antonio Arantes De Paiva 6
Ana Lúcia Carlos Pereira 6
Willey Lopes Sucasas 6
Plínio Leite Nunes 6
Daniel Leon Bialski 6
Maria Cláudia De Seixas 6
Mauro de Almeida Felix 5
Mauro Evando Guimaraes 5
Vagner da Costa 5
Merhej Najm Neto 5
Emerson Davis Leônidas Gomes 5
César Castellucci Lima 5
Silvio Rogerio do Prado Araujo 5
Paulo Marzola Neto 5
João Vieira Neto 5
Ronaldo Camilo 5
Luiz Gustavo Vicente Penna 5
Sem Representação Nos Autos 5
Fabrício De Oliveira Campos 4
Clovis Sahione 4
Ezizio Alves Barbosa 4
Carlos Alberto Froio Coelho Dorta 4
Sandro Henrique Audi De Oliveira 4
Rodrigo Goncalves Trindade 4
Heitor Alves 4
Alexandre Lopes de Oliveira 4
Rafael Freitas de Lima 4
Roberto Podval 4
André Ricardo de Lima 4
Ulisses Rabaneda dos Santos 4
Esperamos ter ilustrado, com esses exemplos, a importância dos dados para os novos desafios impostos às profissões jurídicas. Acreditamos que o desenvolvimento dessa competência pode ser determinante para os profissionais de agora de do futuro.
Ricardo Fernandes Paixão – Doutor em administração pela FEA USP, MBA pelo INSEAD e professor na Faculdade de Direito da UnB
Henrique Araújo Costa – Advogado, doutor em direito pela PUC SP e professor na Faculdade de Direito da UnB
Fonte:
http://www.ouropretoonline.com/modules/news/article.php?storyid=61224