Juiz alerta para ‘perpetuação da crença de que cargos públicos são destinados a corrupções’

Na sentença em que condenou ex-secretário de Finanças de Santo André a 18 anos e dois meses de prisão por propina de R$ 1,17 milhão, magistrado Marcos Fluery de Alvarenga, da 12.ª Vara Criminal de São Paulo, aponta para as ‘consequências absolutamente nefastas’

Ao condenar a 18 anos, 2 meses e 12 dias de reclusão o ex-secretário de Orçamento, Planejamento e Finanças de Santo André (Grande São Paulo), Arnaldo Augusto Pereira, e, ainda, o empresário Renato dos Santos Neto a 11 anos e 8 meses de prisão, ambos por exigência de propina de R$ 1,17 milhão de uma construtora para aprovar projeto de loteamento, o juiz Marcos Fleury Silveira de Alvarenga, da 12.ª Vara Criminal de São Paulo, chamou a atenção para ‘as condutas de altíssima reprovabilidade perpetradas pelos réus’.

 

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‘CONSEQUÊNCIAS NEFASTAS’   PDF

 

O magistrado aponta as ‘consequências absolutamente nefastas’ da conduta imputada aos réus. “Devem primordialmente serem consideradas as condutas de altíssima reprovabilidade perpetradas pelos réus, bem como às circunstâncias e consequências absolutamente nefastas de referido comportamento/ação criminosa, suas extensões, agentes/partes envolvidas e magnitude financeira.”

 

Fleury destacou manifestação do Ministério Público ao calcular e impor sanções elevadas aos acusados. Ele levou em conta ‘muito mais que ausência de antecedentes e primariedade para a fixação do ‘quantum’ das penas a serem cominadas e regime inicial’.

 

Ressaltou palavras do Ministério Público sobre ‘a gravidade concreta das condutas que perpetuou a crença de que cargos públicos comissionados e de confiança são destinados à corrupções, concussões, em prejuízo do interesse público’.

 

“As circunstâncias reprováveis das exigências, que envolveram ameaças de que o empreendimento de interesse da sociedade, principalmente moradia popular, não se efetivaria sem o pagamento”, assinala o magistrado.

 

No entendimento de Marcos Fleury Silveira de Alvarenga. ‘o ‘quantum’ de penas efetivamente determinadas deve ainda ter como parâmetro/diretriz a não só servir de exemplo do que a ordem jurídica reserva para crimes de tal monta/natureza, como de efetivo/real desestímulo a renovação/prática de tais crimes’.

 

Arnaldo Pereira e Renato foram condenados por concussão e lavagem de dinheiro. Segundo o Ministério Público, eles exigiram a propina de R$ 1,17 milhão da construtora para agilizar a aprovação de um projeto de loteamento em Santo André.

 

Ex-auditor fiscal do município de São Paulo, Arnaldo Pereira exerceu as funções de subsecretário de Finanças da capital – 27 de outubro de 2006 a 5 de janeiro de 2009, período em que integrou, segundo o Ministério Público, a ‘Máfia do ISS’. Ele chegou a ser preso.

 

Ele ocupou o cargo de secretário de Orçamento e Planejamento de Santo André, de 5 de fevereiro de 2009 a 21 de dezembro de 2011, onde acumulou a função de secretário de Saúde entre 1 de abril de 2010 e fevereiro de 2011.

 

No período em que Arnaldo dirigiu a Finanças de Santo André estava em curso procedimento administrativo para aprovação de um loteamento da construtora.

 

Segundo a investigação, o processo ‘vinha sofrendo inúmeros impasses burocráticos para aprovação do loteamento perante a municipalidade, gerando incomum atraso no andamento do projeto’.

 

A Promotoria afirma que Arnaldo Pereira determinou aos representantes da construtora que fechassem um contrato fictício de serviços com a empresa de consultoria em sistemas, cujo sócio administrador é seu amigo de infância Renato dos Santos Neto, para emissão de notas fiscais ‘frias’.

 

A Promotoria destaca que os ‘valores de origem criminosa’ foram depositados na conta bancária dessa empresa, que nunca prestou os serviços lançados em notas.

 

A investigação mostra que Arnaldo Pereira recebeu, ‘com o auxílio de Renato’, o valor total de R$ 749 mil, parcelado em sete vezes de R$ 107 mil, nas contas bancárias da consultoria em sistemas.

 

Após o pagamento das 7 parcelas de propina, Arnaldo exigiu a continuidade dos pagamentos mensais ‘até que o processo de aprovação do loteamento chegasse à conclusão final’.

 

“Os representantes da construtora, sem opção e com a esperança de que o projeto fosse finalmente aprovado, cederam às novas exigências de Arnaldo, secretário do município de Santo André na época”, assinala o Ministério Público.

 

A construtora efetuou outros quatro depósitos na conta bancária da empresa de Renato.

 

O rastreamento bancário realizado pelo Ministério Público Estadual mostra que, ao final, foram repassados ao então secretário de Orçamento e Planejamento de Santo André a soma de R$ 1,17 milhão, mediante onze pagamentos de R$ 107 mil.

 

Ao condenar Arnaldo e Renato, o juiz Marcos Fleury de Alvarenga observou. “Com efeito, em que pesem as negativas, versões e álibis dos denunciados quando interrogados em juízo, não só absolutamente dissociadas e divergentes dos demais elementos de prova e convicção, como em momento algum convincentes diante do conjunto de provas.”

 

Para o magistrado ‘a prova amealhada bem demonstra que o denunciado Arnaldo Augusto Pereira pelos cargos de secretário de Orçamento e Finanças e de secretário de Saúde de Santo André, reunia todas as condições políticas e hierárquicas para definir o destino do citado processo administrativo no âmbito da prefeitura de Santo André’.

 

COM A PALAVRA, A DEFESA DE ARNALDO PEREIRA DOS SANTOS

 

A reportagem busca contato com a defesa do ex-auditor Arnaldo Pereira dos Santos. No processo, ele negou os ilícitos.

 

COM A PALAVRA, A DEFESA DE RENATO DOS SANTOS NETO

 

Os advogados Daniel Bialski e João Batista Augusto Junior que representam a defesa de Renato dos Santos Neto afirmam, em nota, que ‘a condenação não tem nenhuma base de sustentação’.
“Buscaremos sua absolvição perante o Tribunal. Renato é pessoa de bem, um trabalhador e jamais praticou qualquer ato ilícito em sua vida. Ele não pode ser responsabilizado por atos, eventualmente, praticados por terceiros, razão pela qual a defesa tem plena convicção que sua inocência será reconhecida em grau recursal”, ressaltam Daniel Bialski e João Batista Augusto Junior.

 

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