Novo ministro tem a responsabilidade de elaborar voto sobre caso que Teori Zavascki pediu vista
Publicada em: 27/03/2017 às 17h27 (coletada em 27/03/2017 às 20h04)
Geraldo Magela/Agência Senado
Está nas mãos do novo ministro do Supremo Tribunal Federal (STF), Alexandre de Moraes, liberar para votação um processo polêmico sobre a descriminalização do consumo de drogas. A ação está parada desde setembro de 2015, quando o então ministro Teori Zavascki pediu vista. Como sucessor dele, Moraes precisa elaborar o voto para que o processo possa voltar à pauta. E, pelo posicionamento que o novo ministro demonstrou antes de ascender ao STF, sua opinião poderá, no mínimo, intensificar o debate sobre o assunto.
Até o pedido de vista, três integrantes do Supremo votaram favoráveis à descriminalização da maconha: Gilmar Mendes, que é o relator, Luís Roberto Barroso, e Luiz Edson Fachin. Mendes se posicionou para que o porte de todas as drogas para uso pessoal seja descriminalizado. Barroso e Fachin limitaram a liberação à maconha.
Em sua trajetória anterior, Alexandre de Moraes manifestou resistência à ideia de descriminalizar o consumo de drogas. Seu posicionamento mais combativo é mostrado nas imagens de um vídeo em que ele aparece cortando pés de maconha no Paraguai, quando ainda era ministro da Justiça, em julho de 2016. A ação foi resultado de uma parceria entre os governos brasileiro e paraguaio, e resultou na destruição de uma plantação da erva no país vizinho.
Posteriormente, em dezembro, após uma reunião com representantes de organizações não governamentais que atuam em relação à segurança pública, veio à tona um suposto plano de Moraes de erradicar a maconha da América do Sul.
O Ministério da Justiça se apressou em declarar que não havia tal plano e, em nota, explicou que “dentre as várias ideias analisadas, jamais houve qualquer uma no sentido de erradicar o plantio e comercialização da maconha em toda a América do Sul, mesmo porque isso jamais seria de competência do Brasil e não se coaduna com os modernos métodos de combate ao crime organizado”. Segundo o ministério, o objetivo seria fortalecer as ações de inteligência das forças federais e estaduais.
Mas independentemente de haver ou não um plano para erradicação da maconha, o fato é que Moraes se tornou conhecido por uma postura mais conservadora e, juristas entrevistados pelo Justiça & Direito apostam que ele manterá o mesmo estilo no STF.
O advogado Daniel Bialski, especialista em direito penal, aposta que Moraes manterá o mesmo alinhamento em no que se refere ao assunto. “Duvido que ele abandone suas convicções pessoais. [Moraes] sempre demonstrou um posicionamento rigoroso na Secretaria de Segurança de São Paulo e no Ministério da Justiça”, diz o penalista.
Jovacy Peter Filho, professor de direito penal da Faculdade de Direito de Vitória, avalia que, se der continuidade ao discurso que tinha antes de chegar ao Supremo, Moraes deve se manifestar contra a descriminalização da maconha. “Se mantiver a coerência das ações que tinha enquanto ministro da Justiça, que o levaram até a desbastar pés de maconha, ele ficará contra”, aposta o professor, que relembra que a atuação de Moraes tinha um foco bem específico na questão da maconha, que seria a porta de entrada para outras drogas. “Se não foi um posicionamento de ocasião, e é uma convicção íntima, é provável que ele mantenha posicionamento como ministro do STF”, avalia Peter Filho.
Para o professor de direito constitucional do Centro Universitário Unibrasil Paulo Schier, Moraes deve manter a mesma linha que demonstrava antes. Na opinião do professor, ele representa um grupo que espera por isso. “Moraes foi escolhido para defender uma pauta mais conservadora em termos de direitos fundamentais. Acredito que há uma parcela conservadora da sociedade que ele foi nomeado para representar”, observa o Schier.
Não vira o jogo sozinho
A presença de Moraes pode tornar o debate mais acirrado, mas não necessariamente irá mudar o placar, caso se mantenha tendência que foi demonstrada pelos três primeiros votos.
Peter Filho considera que a presença de Moraes deixará a temperatura mais alta no Supremo durante a votação desse caso, mas isso não necessariamente pesará no placar além do próprio voto do novo ministro. “Não acredito que a presença dele por si só seja capaz de mudar o entendimento dos demais ministros. São julgadores muito maduros”, aponta o professor de direito penal.
O professor também relembra que Joaquim Barbosa muitas vezes conseguia polemizar, mas isso não resultava em mudança de ideia por parte dos demais ministros.
Discurso X prática
Moraes já chegou a defender penas mais brandas para usuários e pequenos traficantes. “Aquela pessoa que, para consumir uma pedra de crack acabou traficando cinco ou seis outras pedras, e foi pega pela primeira vez, está muito mais próxima do usuário do que do médio e grande traficantes. Estes, sim, devem ser combatidos”, afirmou em junho de 2016.
Esse tipo de posicionamento pode gerar algumas dúvidas se o ministro será mesmo tão incisivo em relação às drogas. Mas Bialski ressalta que penas mais brandas não são sinônimo de descriminalizar, e relembra que o próprio STF já tem precedente nesse sentido: que a pena do pequeno traficante deve ser reduzida.
De qualquer forma, no Supremo, o discurso acadêmico ou na vida pública não é garantia de determinada postura. Schier observa que é comum ministros mudarem a postura quando chegam à corte e analisam as questões do ponto de vista constitucional.
Bialski observa que, antes de chegar ao STF, Moraes não teve oportunidade de se debruçar e analisar todas as questões relacionadas ao tema, e talvez diante dos pontos de vista dos demais ministros que já votaram ele mude o entendimento. “Se ele entender que são argumentos extremamente válidos e convincentes, ele poderá mudar de ideia”, diz o advogado.